Hacking de Redes Wi-Fi: Ferramentas e Técnicas

Introdução ao Hacking de Redes Wi-Fi: Ética e Fundamentos

A segurança de redes sem fio é um dos pilares fundamentais da cibersegurança moderna. Com a onipresença do Wi-Fi em residências, empresas e espaços públicos, a superfície de ataque para cibercriminosos expandiu-se drasticamente. Este artigo técnico destina-se a estudantes de segurança da informação, administradores de rede e pentesters (testadores de intrusão) que desejam compreender as ferramentas e técnicas utilizadas para auditar a segurança de redes Wi-Fi. Aviso Legal: As informações aqui contidas têm fins estritamente educacionais. A invasão de redes sem autorização é crime tipificado em diversas legislações ao redor do mundo. Utilize este conhecimento apenas em redes que você possui ou para as quais tem permissão explícita de auditoria.

Pentester analisando segurança de rede Wi-Fi

Para entender como comprometer uma rede, primeiro é necessário compreender como ela protege os dados. A evolução dos protocolos de segurança — do obsoleto WEP ao robusto WPA3 — conta a história de uma corrida armamentista entre engenheiros de segurança e hackers. Neste guia, exploraremos o ciclo de vida de um teste de penetração em Wi-Fi: reconhecimento, captura, ataque e pós-exploração.

Hardware Necessário: O Modo Monitor

Antes de mergulhar no software, é crucial abordar o hardware. Nem todas as placas de rede Wi-Fi são criadas iguais. Para realizar ataques de Wi-Fi, a placa de rede deve suportar dois recursos essenciais:

  • Modo Monitor: Permite que a placa "escute" todo o tráfego aéreo na frequência, não apenas os pacotes destinados ao seu dispositivo. Sem isso, a captura de handshakes é impossível.
  • Injeção de Pacotes: A capacidade de enviar pacotes customizados para a rede, essencial para ataques de desautenticação (deauth) e injeção de tráfego para acelerar a quebra de chaves.

Chipsets famosos como o Atheros AR9271 e certos modelos da Realtek e Ralink são os preferidos na comunidade de segurança. Adaptadores USB da marca Alfa Network são frequentemente citados como o "padrão ouro" para iniciantes e profissionais devido à sua compatibilidade nativa com o Kali Linux.

O Ecossistema de Ferramentas: Kali Linux e Aircrack-ng

Embora existam ferramentas para Windows e macOS, o Linux — especificamente a distribuição Kali Linux — reina supremo no hacking de Wi-Fi. O coração da maioria das auditorias Wi-Fi é a suíte Aircrack-ng.

Interface do Aircrack-ng no Kali Linux

A suíte Aircrack-ng não é uma ferramenta única, mas um conjunto de programas que trabalham em harmonia:

  • airmon-ng: Responsável por colocar a placa de rede em modo monitor.
  • airodump-ng: O "sniffer". Ele captura pacotes, visualiza redes disponíveis (BSSIDs), clientes conectados e canais utilizados.
  • aireplay-ng: A ferramenta de injeção. Usada para forçar a desconexão de usuários legítimos (ataque deauth) para capturar o handshake de reconexão.
  • aircrack-ng: O "cracker". Utiliza algoritmos de força bruta ou ataques de dicionário para decifrar a senha a partir dos dados capturados.

Outras Ferramentas Essenciais

Além do Aircrack-ng, um auditor competente deve dominar:

  • Kismet: Um detector de rede sem fio passivo extremamente poderoso. Diferente do airodump, ele pode detectar redes ocultas e mapear dispositivos sem enviar nenhum pacote, tornando-o ideal para operações furtivas.
  • Wifite: Um script em Python que automatiza todo o processo de hacking. Ele escaneia, seleciona alvos e executa ataques sequenciais (WPS, WPA, WEP) sem a necessidade de digitar comandos complexos manualmente.
  • Hashcat: Embora o aircrack-ng possa quebrar senhas, o Hashcat é o rei da quebra de hashes baseada em GPU. Para senhas WPA2 complexas, usar a placa de vídeo com Hashcat é exponencialmente mais rápido do que usar a CPU.
  • Wireshark: Para análise profunda de pacotes. Após descriptografar o tráfego, o Wireshark permite visualizar o conteúdo dos dados, como sites visitados e credenciais não criptografadas.

Técnicas de Ataque: Do Reconhecimento à Quebra da Chave

1. Ataques a Redes WEP (Wired Equivalent Privacy)

Embora o WEP esteja praticamente extinto devido à sua fragilidade, ele ainda aparece em sistemas legados. O WEP sofre de falhas estatísticas graves no seu algoritmo de criptografia (RC4). A técnica principal aqui é a injeção de pacotes ARP para gerar tráfego rapidamente. Ao capturar vetores de inicialização (IVs) suficientes, a chave pode ser recuperada matematicamente em questão de minutos, com 100% de certeza, independentemente da complexidade da senha.

2. Quebrando WPA/WPA2: O Handshake de 4 Vias

O padrão WPA2 é muito mais seguro e não possui as falhas estatísticas do WEP. O vetor de ataque principal aqui é o 4-Way Handshake. Quando um cliente se conecta ao roteador, eles trocam quatro pacotes para verificar a senha sem transmiti-la diretamente. O hacker precisa:

  1. Monitorar a rede alvo com airodump-ng.
  2. Identificar um cliente legítimo conectado.
  3. Usar o aireplay-ng para enviar pacotes de desautenticação, derrubando o cliente momentaneamente.
  4. Quando o cliente se reconecta automaticamente, o atacante captura o handshake.
  5. O handshake capturado é então submetido a um ataque de dicionário ou força bruta offline.
Diagrama do 4-Way Handshake WPA2

A limitação deste método é que ele depende da qualidade da sua lista de palavras (wordlist). Se a senha for "Xy9#mKp!2", e essa combinação não estiver no seu dicionário, o ataque falhará.

3. Vulnerabilidades WPS (Wi-Fi Protected Setup)

O WPS foi criado para facilitar a conexão de dispositivos, mas introduziu uma falha crítica. O ataque de força bruta ao PIN do WPS (conhecido como ataque Reaver ou Bully) permite descobrir o PIN de 8 dígitos. Uma vez que o PIN é descoberto, o roteador revela a senha WPA2 em texto claro. Embora muitos roteadores modernos tenham proteção contra tentativas excessivas (rate limiting), o ataque Pixie Dust pode recuperar o PIN em segundos em chipsets vulneráveis, explorando a entropia fraca na geração de números aleatórios.

4. Evil Twin (O Gêmeo Maligno)

Esta é uma técnica de Engenharia Social. O atacante cria um ponto de acesso falso com o mesmo nome (SSID) e endereço MAC da rede legítima, mas com um sinal mais forte. Simultaneamente, ele realiza um ataque de negação de serviço (DoS) no roteador original. Os usuários, desconectados da rede real, conectam-se automaticamente ao gêmeo maligno. Ao tentar navegar, são redirecionados para uma página falsa de login que solicita a senha do Wi-Fi para "atualização de firmware" ou "restauração de conexão".

Ataques Modernos: PMKID e WPA3

Recentemente, uma nova técnica descoberta pelos desenvolvedores do Hashcat permitiu capturar o PMKID (Pairwise Master Key Identifier) diretamente do roteador, sem a necessidade de aguardar um cliente se conectar ou capturar um handshake completo. Isso simplifica drasticamente a captura de dados para posterior quebra de senha.

Quanto ao WPA3, o novo padrão, ele utiliza o protocolo SAE (Simultaneous Authentication of Equals), que torna os ataques de dicionário offline impraticáveis. No entanto, vulnerabilidades de implementação (como o ataque Dragonblood) já foram demonstradas, provando que a segurança é um alvo móvel e constante.

Defesa e Mitigação: Como se Proteger

Como especialista em segurança, o objetivo de aprender a atacar é saber defender. Aqui estão as melhores práticas para blindar uma rede Wi-Fi contra as técnicas mencionadas:

  • Senha Forte: O conselho mais antigo, porém o mais eficaz contra ataques WPA2. Use senhas longas (mais de 12 caracteres), com misturas de símbolos, números e letras. Isso torna as rainbow tables e ataques de dicionário inúteis.
  • Desativar WPS: O WPS é o vetor de ataque mais fácil. Desative-o nas configurações do roteador imediatamente.
  • Atualização de Firmware: Fabricantes corrigem falhas como a do KRACK (Key Reinstallation Attack) ou vulnerabilidades de WPS em atualizações de software.
  • Segmentação de Rede: Use uma rede de convidados (Guest VLAN) para dispositivos IoT e visitantes, isolando-os da sua rede principal onde residem dados sensíveis.
  • Monitoramento de Sinal: Ferramentas de IDS (Intrusion Detection System) para Wi-Fi podem alertar sobre picos de pacotes de desautenticação, indicando um ataque ativo.

O hacking de redes Wi-Fi é uma disciplina complexa que exige conhecimento profundo de redes TCP/IP, criptografia e hardware. Dominar ferramentas como o Aircrack-ng e entender a anatomia de um handshake não apenas permite testar a segurança de sistemas, mas também desmistifica a "mágica" da conectividade sem fio, revelando as camadas lógicas que mantêm nosso mundo digital conectado.

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